A VERDADE
Este poema de Carlos Drummond de Andrade é um ótimo exemplo de texto com coerência, pois percebe-se que há nele “uma continuidade de sentidos entre elementos inscritos e descritos” em seu corpo. A percepção deste pressuposto implica a nossa competência textual de leitores. As diferentes e múltiplas interpretações e significados são decorrentes da leitura de mundo e sensibilidade de cada leitor.
A presente análise busca abarcar aspectos puramente literários, embora a complexidade do poema permita outras leituras à luz de diversos campos do saber como a Psicanálise, a Filosofia e o Direito.
O poema nos apresenta o tema “verdade” como algo pessoal, intuitivo, distorcido, dual, mutável e não absoluto. Chega-se a estes conceitos através de uma coerência sintática que atende aos padrões da língua culta: pontuação e acentuação corretas; adequação na concordância nominal/verbal; uso correto de pronomes e conectivos; parágrafos (quatro estrofes) bem divididos.
Importante apontar a idéia de verdade não determinada, não delimitada no próprio título do poema. Ao omitir o artigo “a”, sendo simplesmente “Verdade”, o título escolhido pelo autor já é um prenúncio de como a idéia será abordada textualmente.
Quanto aos recursos estilísticos percebe-se claramente que o poeta opta pelo uso de verbos no pretérito imperfeito. Apenas na última estrofe aparecem verbos no pretérito perfeito (“chegou-se” e “optou”). O predomínio do pretérito imperfeito e o modo como eles se conectam a cada estrofe, gradativamente, corroboram a idéia de “verdade” imperfeita; não absoluta. Na primeira estrofe, “estava” e “deixava passar” referem-se à “porta da verdade”. Na segunda estrofe, “era”, “entrava”, “conseguia”, “voltava” e “coincidiam” estão associados “a impossibilidade de se atingir totalmente a verdade. A divisão desta verdade em pares diferentes nos é apresentada na terceira estrofe, na qual os verbos são “arrebentaram”,