A Pane
(1955 – 1956)
Friedrich Dürrenmatt PRIMEIRA PARTE
Existem ainda, histórias possíveis, historias para escritores? Se alguém não quiser narrar sobre si mesmo, generalizar seu eu de maneira romântica, lírica, se não sentir a obrigação de falar de suas esperanças e derrotas, com total veracidade, de falar do seu modo de deitar-se com mulheres, como se a veracidade transpusesse tudo isso para o âmbito geral, e não para o plano da Medicina, da Psicologia na melhor das hipóteses..., se alguém não quisesse fazer isso, mas antes recuar discreto, educadamente preservando a esfera privada, tendo a trama diante de si como um escultor tem seu material, e nela trabalhar, nela se desenvolver, e como uma espécie de artista clássico tentar não se desesperar de imediato, ainda que seja inegável o puro absurdo que porto dos os lados se revela, então o ato de escrever torna-se mais difícil e solitário, mais sem sentido também. Uma boa nota na História da Literatura não interessa – afinal, quem é que já não ganhou uma boa nota, que embustes já não foram premiados com distinção? –, as exigências do momento são mais importantes.No entanto, também aqui nos vemos diante de um dilema e uma situação ruim no mercado. A vida oferece puro e simples entretenimento: à noite, o cinema; no jornal diário, a poesia, bem ou mal. Por um pouco mais – num gesto de generosidade social, já a partir de um franco suíço – exige-se a alma, confissões, veracidade mesmo; deve-se veicular valores elevados, lições de moral, sentenças úteis,alguma coisa deve ser superada ou afirmada, ora o Cristianismo, ora o desespero corrente – literatura enfim.Porém, e se o autor se recusar a produzir tal coisa? E se, cada vez mais decidido e obstinado, certo de que a razão para sua escrita esta nele mesmo, em seu consciente ou inconsciente, dependendo, de caso acaso, de uma dose de sua crença ou de sua duvida, mas julgando