A origem das espécies
Daniel Simão Nascimento
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Em seu livro intitulado O mistério do samba, Hermano Vianna busca dar conta da transformação decisiva pela qual passou o samba no século passado. Gênero que foi de música do morro para símbolo da identidade nacional, o samba aparece no livro como “um campo privilegiado onde é possível perceber determinados aspectos do debate sobre a definição da identidade brasileira e suas sequelas”[1]. O livro de Vianna pretende, assim, contar a história da invenção de uma tradição, da fabricação de uma autenticidade.
O mote do livro é um encontro que aconteceu em 1926, ano da primeira visita do antropólogo Gilberto Freyre ao Rio de Janeiro. O referido encontro juntou Freyre, Heitor Villa-Lobos, Pinxinguinha, Donga, Sérgio Buarque de Holanda e Patrício Teixeira, entre alguns outros mais, numa noitada de violão que acabou nas páginas da coluna social da Revista da Semana. Vianna nos mostra o acontecimento como a prova da convivência harmoniosa, pois fundamentalmente recreativa, de intelectuais ligados à arte erudita, provenientes das chamadas ‘boas famílias brancas’ cariocas, e músicos negros ou mestiços de origem bastante humilde, saídos das camadas pobres do Rio de Janeiro. Mais do que isso, no entanto, os nomes de Pixinguinha, Donga e Patrício não podem deixar de nos referir ao que de melhor se produzia em termos de música popular brasileira naquele momento. No livro de Vianna, podemos ler o seguinte depoimento de Freyre sobre o encontro:
Ontem, com alguns amigos – Prudente, Sérgio – passei uma noite que quase ficou de manhã a ouvir Pixinguinha, um mulato tocar em flauta coisas suas de carnaval, com Donga, outro mulato, no violão, e o preto bem preto Patrício a cantar. Grande noite cariocamente brasileira.
Ouvindo os três sentimos o grande Brasil que cresce meio tapado pelo Brasil oficial e postiço e ridículo de mulatos a quererem ser helenos (...) e de