A doida
Gosto de contos. Quando soube que Carlos Drumond publicou em 1951 Contos de aprendiz, logo tive interesse em ler. Uma das histórias, A Doida, me levou em uma viagem à infância onde o poder da fantasia me fez imaginar estar na companhia do poeta, também menino, a experimentar as aventuras do tempo em que o mundo nos parecia mais encantado. A história nos conta sobre uma mulher louca que vivia sozinha numa casa isolada. Os meninos não poderiam ter distração maior do que transformar as lições de pecado, de suas mães, em algo tão bom como uma aventura em grupo de atirar pedras contra a vidraça daquela mulher doente para vê-la furiosa. A loucura vem sempre acompanhada de mitos. Eles são necessários para atenuar as necessidades em explicar o que não se conhece de fato. Teria sido ela a perversa que quase mata o pai envenenado? Ou uma vítima de uma briga com o seu noivo no dia do casamento? As figuras masculinas de pai e noivo são envolvidas com frequência nas histórias de loucura feminina. A mulher para amar um homem diferente do seu pai é um tema recorrente em histórias produzidas pelo inconsciente coletivo: ou como uma fera que precisaria ser amada para desencantar-se e se transformar no homem idealizado - seu príncipe; ou ser capaz de beijar um sapo para ter esse mesmo resultado. Drumond descreve o cenário onde habita a pobre mulher: é em meio a um jardim tão maltratado quanto ela. Pela janela só se podia avistá-la em fragmentos, como que só a mostrar o peito, lugar onde habita o coração. As crianças que lhe atiravam pedras, simbolicamente, podemos entender como a imaturidade do homem que agride a todo aquele diferente do que foi aprendido como o ideal de ser. É como se esse “diferente” tivesse que pagar por um erro, assim como a Geni de Chico Buarque que “era feita para apanhar e era boa de cuspir”. As pedras no entanto, era um meio de comunicação com o mundo que reconhecia assim a existência da