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Alexandre Herculano
I
Salve, ó vale do sul, saudoso e belo!
Salve, ó pátria da paz, deserto santo,
Onde não ruge a grande voz das turbas!
Solo sagrado a Deus, pudesse ao mundo
O poeta fugir, cingir-se ao ermo,
Qual ao freixo robusto a frágil hera,
E a romagem do túmulo cumprindo,
Só conhecer, ao despertar na morte,
Essa vida sem mal, sem dor, sem termo,
Que íntima voz contínuo nos promete
No trânsito chamado o viver do homem.
II
Suspira o vento no álamo frondoso;
As aves soltam matutino canto;
Late o lebréu na encosta, e o mar sussurra
Dos alcantis na base carcomida:
Eis o ruído de ermo! Ao longe o negro,
Insondado oceano, e o céu cerúleo
Se abraçam no horizonte. Imensa imagem
Da eternidade e do infinito, salve!
III
Oh, como surge majestosa e bela,
Com viço da criação, a natureza
No solitário vale! E o leve insecto
E a relva e os matos e a fragrância pura
Das boninas da encosta estão contando
Mil saudades de Deus, que os há lançado,
Com mão profusa, no regaço ameno
Da solidão, onde se esconde o justo.
E lá campeiam no alto das montanhas
Os escalvados píncaros, severos,
Quais guardadores de um lugar que é santo;
Atalaias que ao longe o mundo observam,
Cerrando até o mar o último abrigo
Da crença viva, da oração piedosa,
Que se ergue a Deus de lábios inocentes.
Sobre esta cena o sol verte em torrentes
Da manhã o fulgor; a brisa esvai-se
Pelos rosmaninhais, e inclina os topos
Do zimbro e alecrineiro, ao rés sentados
Desses tronos de fragas sobrepostas,
Que alpestres matas de medronhos vestem;
O rocio da noite à branca rosa
No seio derramou frescor suave,
E inda existência lhe dará um dia.
Formoso ermo do sul, outra vez, salve!
IV
Negro, estéril rochedo, que contrastas,
Na mudez tua, o plácido sussurro
Das árvores do vale, que vicejam
Ricas d’encantos, coa estação propícia;
Suavíssimo aroma, que, manando
Das variegadas flores, derramadas
Na sinuosa encosta da montanha,
Do altar da solidão subindo