Técnico-instrumental
Gilberto Freyre, “cultura nacional” e a antropologia brasileira: revisões e contribuições de um passado incompreendido
Telmo Pedro Vieira1
Marcos Aurélio da Silva2
Universidade Federal de Santa Catarina
A última década do século XX e aurora do novo milênio foram marcadas por um conjunto de debates públicos no Brasil que, de certa forma, resgataram a figura e a obra de Gilberto Freyre. As discussões não se deveram ao centenário de nascimento (2000) do escritor de Casa-grande & Senzala, mas justamente a esta que é sua obra prima. O debate, porém, tem obscurecido o lado científico e antropológico da principal obra – a primeira de muitas – de Freyre. O livro, lançado em 1933, tem sido lido e relido como uma das muitas tentativas, comuns naquela época3, de “interpretação geral do Brasil”
(Melatti, 1984:10). Mas talvez por ter sido saudado, desde as primeiras edições, como uma narrativa possível para a construção da nação brasileira (Ortiz, 1985:40) – principalmente pelas novas lideranças políticas que nos anos de 1930 pretendiam dar novos rumos ao país4 – pouca atenção se dá ao trabalho de Freyre como precursor da antropologia contemporânea no Brasil.
Casa-grande & Senzala marca o início da antropologia contemporânea no Brasil e consagra Freyre como o primeiro antropólogo do país a se apoiar em teorias de fundo social e cultural (e não biológico, como apregoavam as teorias raciológicas e evolucionistas até então em voga). A exaustiva etnografia, realizada por vários anos, talvez seja
1 Doutor em Antropologia pela Universidade de Salamanca. Professor da Universidade Federal de Santa
Catarina.
2 Doutorando em Antropologia da Universidade Federal de Santa Catarina.
3 Na mesma década de 1930, outras duas obras interpretativas do Brasil ganharam destaque: Evolução
Política do Brasil (1933), de Caio Prado Júnior, e Raízes do Brasil (1936), de Sérgio Buarque de Hollanda.
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