Transferência Contratransferência
Revista Brasileira de Psicanálise · Volume 42, n. 1, 100-111 · 2008
Transferência e contratransferência: a clínica viva
Maria do Carmo Andrade Palhares*1
Resumo: Neste trabalho, a articulação entre transferência e contratransferência destaca o campo psicanalítico como expressão viva do encontro humano. A abrangência e a complexidade do tema são abordadas na perspectiva de diversos autores psicanalíticos. Da tradição à contemporaneidade, percorremos um vasto território conceitual, ratificando, desde a descoberta por Freud, o vigor desse fenômeno relacional que desafia ativamente a continuidade do processo analítico. Buscamos destacar a vivacidade e a importância do manejo dessa experiência como aspectos fundamentais à manutenção e à expansão da prática psicanalítica no mundo atual. Daí se origina um percurso que vai da ontologia à constituição do psiquismo como questão do humano na modernidade.
Palavras–chave: transferência; contratransferência; ontologia; psiquismo; repetição; manejo.
De forma imperiosa, convicta, necessitada, ela me diz:
“Você! Ah, você está a meu serviço!”
Estamos diante de uma criança? Cronologicamente, não. Estamos diante de um adulto cujo olhar infantil reivindica algo primordial: ser atendido em suas necessidades iniciais de vida. O que sou eu para alguém que me apresenta de maneira tão visceral sua procura pelo vínculo humano? A resposta a essa pergunta nos lança nas vicissitudes da prática clínica. E, como toda prática, esta exige, além do conhecimento, manejo: ação terapêutica. Se a psicanálise se coloca como cura pela palavra, como manejar situações difíceis, infantis, regredidas, pertencentes tantas vezes a um período não-verbal? Uma palavra surge com toda a sua força relacional: transferência.
A transferência em si já nos fala de algo vivo. Isso porque ela emerge do contato emocional dos pacientes com a situação analítica. No entanto, hoje sabemos que exatamente o acontecimento transferencial também induz o analista a produzir