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A oposição de Platão à democracia explora outra tensão que aparentemente existe na teoria democrática. Tal como «monarquia» significa «governo pelo monarca», «democracia» quer dizer «governo pelo demos». Mas o que é o demos? Em grego clássico tanto pode ser entendido como «o povo» ou «a populaça». No segundo sentido, então, a democracia é o governo pela populaça: o governo da ralé, do vulgo, dos sujos, dos inaptos.
Mas este insulto à democracia é um mero preliminar para os principais argumentos antidemocráticos de Platão. A sua arma básica é a chamada «analogia das profissões». O argumento é muito simples. Se estivéssemos doentes, e precisássemos de nos aconselhar com alguém em matéria de saúde, procuraríamos um especialista — o médico. Por outras palavras, quereríamos consultar alguém que tenha tido formação específica para desempenhar a tarefa. A última coisa que desejaríamos seria reunir uma multidão e pedir aos presentes que elegessem, através de voto, o remédio certo.
A saúde do estado tem tanta ou mais importância que a saúde de um dado indivíduo. Tomar decisões políticas — decisões no interesse do estado — requer reflexão e competência na matéria. Segundo Platão, é função que se deveria deixar aos especialistas. Permitir que o povo decida é como navegar em alto mar consultando os passageiros, ignorando ou desprezando aqueles que são verdadeiramente competentes na arte da navegação. Tal como um navio assim comandado se transviará e irá a pique, também — diz Platão — o navio do estado naufragará.
Mas onde estão os governantes especializados? Neste ponto, a resposta de Platão é simples e, para muitos dos seus prováveis leitores, lisonjeira. A sociedade justa é impossível, a menos que os reis se tornem filósofos ou os filósofos se tornem reis. A formação filosófica, afirma Platão, é uma qualificação necessária para governar. Com tornar-se filósofo, Platão não quer dizer que basta passar uns anos a ler e a pensar acerca da