Textos
Você deve lembrar algumas imagens daqueles quadros de famílias nobres ou mesmo reais, entre os séculos XVII e XVII. Pelo menos algumas dessas imagens você deve ter visto. Alguns quadros famosos vêm desde pelo menos a Renascença, outros chegam até mesmo ao século XIX. Há neles, entre outros, um detalhe que chama a atenção. As pessoas estão sempre posando com o ar solene de sua nobreza. Aquelas eram as fotografias de suas épocas. As pessoas estão ali tão majestosas que algumas acabam sendo mesmo ridículas. Mas em algumas há uma imagem dentro da imagem que chama também a atenção. Em muitos desses quadros há crianças: um par de príncipes, uma menina-infanta, um jovem nobre.
E o que há de notável nesses quadros, alguns deles de grandes pintores da época? Há um pequeno e inevitável detalhe muito interessante. Michel Foucault abre um de seus livros mais conhecidos: as palavras e as coisas, com um curioso olhar sobre um quadro de Velásquez, chamado: “as meninas”.
E, lá estão elas. No rosto, no olhar, na pose, nas roupas e nos calçados, são em quase tudo como os adultos. Sendo crianças, elas são réplicas das pessoas adultas ao seu lado.l Não há gestos do rosto ou do corpo, assim como não há vestidos ou sapatos próprios para elas, duas meninas. Assim, as crianças de então, sendo meninos ou meninas, não são mais do que desafortunados e imperfeitos espelhos de como os adultos, seus pais, seus mestres, são, ou acham que devem ser.
Em um belo livro sobre a família e a criança no Ocidente, Phillipe Ariés lembra que por muitos séculos, em toda a Europa a criança e o adolescente mal existiam[1]. Quer dizer, por toda a parte, como agora, meninos e meninas. E mais do que agora, porque mesmo com índices muito altos de mortalidade infantil, as famílias eram quase sempre numerosas. No entanto, de um ponto de vista social, como sujeitos de uma família, de uma igreja, de uma comunidade, de uma comunidade local ou nacional, como um valor