Texto de Lima Barreto

22265 palavras 90 páginas
Lima
Barreto
Diário do hospício As anotações que constituem o Diário do hospício foram feitas por Lima Barreto durante a sua segunda internação no Hospital Nacional de Alienados (dezembro de 1919 a fevereiro de 1920) e encontram-se na
Seção de Manuscritos da Biblioteca Nacional. O autor escreveu a lápis, em tiras de papel ora pautadas e mais estreitas (as correspondentes aos dois primeiros capítulos), ora sem linhas e mais largas. A situação desses escritos é bastante delicada. As tiras apresentam quase sempre danificações nas bordas superiores e inferiores e às vezes manchas e pequenos furos.

I
1920
4 de Janeiro
(No manuscrito a data aparece riscada. Em cima, no canto direito da mesma folha, há uma outra indicação: 26 a 29-12-19, referente ao período em que está concentrada a narrativa no primeiro capítulo.)

O Pavilhão e a Pinel
Estou no Hospício ou, melhor, em várias dependências dele, desde o dia 25 do mês passado. Estive no pavilhão de observações, que é a pior etapa de quem, como eu, entra para aqui pelas mãos da polícia.
Tiram-nos a roupa que trazemos e dão-nos uma outra, só capaz de cobrir a nudez, e nem chinelos ou tamancos nos dão. Da outra vez que lá estive (Referência à sua primeira internação no hospício, de 18 de agosto a 13 de outubro de 1914.) me deram essa peça do vestuário que me é hoje indispensável. Desta vez, não. O enfermeiro antigo era humano e bom; o atual é um português (o outro o era) arrogante, com uma fisionomia bragantina e presumida. Deram-me uma caneca de mate e, logo em seguida, ainda dia claro, atiraram-me sobre um colchão de capim com uma manta pobre, muito conhecida de toda a nossa pobreza e miséria.
Não me incomodo muito com o hospício, mas o que me aborrece é essa intromissão da polícia na minha vida. De mim para mim, tenho certeza que não sou louco, mas devido ao álcool, misturado com toda a espécie de apreensões que as dificuldades de minha vida material há 6 anos me assoberbam, de quando em

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