Tempero da Vida
Por: Roberto D´arte
Odores e sabores estão intimamente ligados à memória e são pontes estreitas entre passado e presente. Todos, de uma forma ou de outra, guardam alguma lembrança de comidas e perfumes que remetem à infância, à adolescência, a momentos marcantes, normalmente carregados dos mais variados sentimentos.
Por duas vezes, que eu me recordo, vivenciei em Viçosa-MG (onde moro) algumas frações de segundos que me remeteram a sensações lá do meu tempo de criança, na década de 70, na minha cidade natal (Boa Nova-BA). O passaporte? Cheiros de comida.
Da primeira vez eu tinha saído de casa pouco depois das 7h30min. Estava próximo a uma praça do Centro, onde fui tomado por um súbito cheiro de banana frita e canela. Não sei de que direção veio, mas instantaneamente me arrebatou com uma cena inteira: eu, com meus 7 ou 8 anos, chegando na casa de um tio muito querido, onde sempre passava para ir com meus primos para a escola. Era comum encontrá-los ainda tomando café da manhã. Vale lembrar que na Bahia há o costume de se comer banana frita (polvilhada com açúcar e canela) como acompanhamento do café, e não no almoço ou jantar, como em Minas e nos demais estados do Sudeste.
Na segunda vez, também no Centro da cidade, senti uma mistura de cheiros, os quais não consegui distinguir naquele exato momento. Tudo foi muito rápido e intenso o bastante para me fazer lembrar dos jantares da minha casa no tempo em que as principais refeições eram feitas à mesa da copa, sempre rodeada por sete pessoas (meu saudoso pai, já falecido, minha mãe, minhas três irmãs, meu irmão e eu). Conversávamos, contávamos casos, ríamos e saboreávamos as delícias que a mão-de-fada da minha mãe preparava. Eu adorava a simplicidade do seu arroz soltinho com farofa de cenoura, ovo frito e carne-de-sol (no Nordeste falamos “carne-do-sol”). No momento em que senti o cheiro que me trouxe aquele instante feliz, certamente algum ingrediente dessa mistura estava presente.