Tabacaria-Fernando Pessoa
A reflexão que o poeta faz da sua vida parece ser a última. O poema dá a ideia de que o “eu” poético sente a necessidade de fazer uma análise de todos os seus problemas para expor a sua desilusão e incompreensão para com os outros e a realidade. É realmente como Robert Bréchon afirma “uma espécie de epopeia do fracasso absoluto”.
No poema é possivel distinguir duas realidades distintas, a do poeta, o seu quarto, e a dos outros, a rua onde está a tabacaria, que são divididas pela janela, que é no fundo a barreira fisica que separara as duas realidades. E sem nunca sair da sua realidade, o seu quarto, o poeta contempla a realidade dos outros, a rua, lamentando as suas perspectivas de vida em tudo falhadas - “Falhei em tudo/Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada”.
O sujeito poético para além de lamentar as seus objectivos inalcançados inveja também os outros que vivem numa realidade diferente da sua. Os exemplos que dá são: a pequena rapariga que come chocolates – “Come, pequena suja, come! /Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!”, o dono da tabacaria- “(..) e o dono da tabacaria sorriu”, o senhor que vai comprar tabaco - “Ah, conheço-o: é o Esteves sem metafísica”- como metáforas da ingenuidade e felicidade que tanto lamenta não ter.
Os sentimentos de desgosto, frustração, inveja e infelicidade do sujeito poético, aproveitando as palavras de Bréchon, traduzem a sua “(...)extraordinária infelicidade de viver” embora sejam expressos com “(...) uma extraordinária felicidade de escrita”.