Síntese 3. o espírito e o cérebro
Eis então duas noções, o cérebro e o espírito, ligados por um só nó que não pode desatar, em torno do qual giram as visões de mundo, do homem, do conhecimento, em relação às quais só se pode decidir com um bárbaro golpe de espada.
O que tem haver esse miolo gelatinoso com as idéias, com a religião, a filosofia, a bondade, a piedade, o amor, a poesia, com a liberdade? Como pode ser que essa substância indolor nos dê a dor? Inversamente, o que sabe o espírito do cérebro? Espontaneamente, nada. O espírito é de uma cegueira extraordinária em relação ao cérebro, sem o qual não existira. A prática médica reconheceu, desde Hipócrates, o papel espiritual do cérebro; o conhecimento experimental começou a explorá-lo.
O espírito nada sabe, por si mesmo, do cérebro que o produz, o qual nada sabe do espírito que o concebe. Há ao mesmo tempo abismo ontológico e opacidade mútua entre, de um lado, um órgão cerebral constituído de milhares de neurônios ligados por redes, movidos por processos elétricos e químicos, e, de outro lado, a Imagem, a Ideia, o Pensamento. Contudo é juntos, mas sem se conhecer, que eles conhecem. A unidade deles é conhecimento, sem que disso tenham conhecimento. São estudados em separado: um pelas ciências biológicas, o outro pelas ciências humanas. Psicociências e neurociências não se comunicam, embora a questão principal para ambas tivesse de ser a da ligação entre elas.
- O grande cisma
Um mesmo paradigma não para de impor um antagonismo insuperável às nossas concepções do espírito e do cérebro. Estas permanecem condenadas à disjunção, à redução (do espírito ao cérebro) ou à subordinação (do cérebro ao espírito). O cérebro foi submetido às leis deterministas e mecanicistas, enquanto o espírito vive na imaterialidade, na criatividade e na liberdade. Quando dois reinos se encontram, entregam-se à Guerra metafísica do Espírito livre contra a Matéria determinista, e será no terreno da