Sousa bibliographie
Cheguei a Veneza ao cair da tarde, no meio de uma imprevisível Primavera, num dia de céu tempestuoso com grandes nuvens cinzentas e escuras, não havia abertas e nenhum raio de luz. Pensei desconsoladamente que não íamos ver o refulgir dos palácios nem a luz sedosa.
Quando entramos no Gran Canale, vi como Veneza, é bela e prodigiosa. Ao meu lado no barco-táxi, iam o meu filho e o meu neto, que exultavam de espanto e descobrimento perante as fachadas de cada palácio, as suas cores diversas, as formas, os estilos, os degraus mergulhados na água, as janelas, as varandas, as colunas finas e as imagens refletidas na laguna. Quando chegamos ao hotel apercebi-me que independentemente do facto de a beleza do Gran Canale nos ter feito esquecer o tempo, o transporte tinha sido muito mais rápido, mais fácil e mais agradável do que atravessar uma cidade entupida de carros.
Depois de vistos os passaportes e arrumadas as malas, saímos do hotel. Mal chegamos à Praça de San Marcos a noite, outrora fria e húmida, tornou-se mágica, onde no grande espaço aberto da praça, subia a altíssima torre quadrangular e se desenhavam colunas e arcadas e as grandes cúpulas da basílica. Era o belo que mesmo às escuras reconhecemos, a cidade nascida da água. E o escuro, o nevoeiro e o invisível estavam povoados por uma multidão de vultos indistintos que davam a impressão de ser leves, desligados, soltos. Nas múltiplas línguas do seu vozear não era possível reconhecer as palavras como não era possível distinguir os seus gestos nem as diversas direções em que caminhavam, em os rostos ocultos sob as mascaras da sombra, era a cidade “das muitas e desvairadas gentes”.
Com eles fomos seguindo e entrámos na Piazetta onde, na fachada iluminada do Palácio dos Doges, sob o nevoeiro, aflorava o maravilhoso cor-de-rosa da pedra. Entre arcadas, cúpulas, sombras e reflexos pairava a presença do longínquo e erguiam-se e uniam-se todas as musas do Oriente – Bizânico, Arábia,