Sergio Buarque
ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS
“Sérgio Buarque de Hollanda teve de explicar, incontáveis vezes, que cordialidade não é sinônimo de cortesia, de gentileza, de boa educação”
Há 70 anos era publicada, no Rio de Janeiro, uma obra que marcaria de forma indelével a cultura brasileira. Trata-se de Raízes do Brasil. O autor, o intelectual, historiador e antropólogo Sérgio
Buarque de Hollanda, é por muitos conhecido como o pai do Chico, o que mostra o poder do genoma; mas ele é, sobretudo, um lúcido intérprete da realidade brasileira.
Há 70 anos, também, o Brasil está envolvido em uma polêmica que Sérgio Buarque de Hollanda involuntariamente provocou. É que, no texto, ele introduziu uma expressão que logo se tornaria muito conhecida, e mal compreendida. Ele falou no “brasileiro cordial”.
Cordial, o brasileiro? A julgar pelo noticiário, não parece. Afinal, estamos num dos países mais violentos do mundo, uma situação que dificilmente combina com cordialidade. Sérgio Buarque de
Hollanda teve de explicar, incontáveis vezes, que cordialidade não é sinônimo de cortesia, de gentileza, de boa educação. A palavra vem do latim cor, cordis, coração, e isto porque o coração sempre foi considerado a sede das emoções. Que, no entanto, podem ser positivas ou negativas, amistosas ou agressivas. Da mesma maneira, aliás, que o coração, que tem duas metades: numa delas circula o sangue venoso, escuro, denso; na outra, o rútilo sangue arterial. Uma duplicidade muito simbólica.
Correndo o risco de uma generalização selvagem podemos dizer, sim, que o brasileiro é um emotivo. Mais: que ele costuma, ou costumava, dar franca vazão a seus instintos, inclusive e principalmente o sexual. Como se dizia à época do Brasil Colônia, “não existe pecado ao sul do
Equador”, frase que, talvez não por coincidência (genoma funciona),