Sandra Caponi
Da Herança à Localização Cerebral: sobre o
Determinismo Biológico de Condutas Indesejadas
SANDRA CAPONI
RESUMO
Analisamos os argumentos utilizados, em dois momentos diferentes do século
XX, para justificar o recurso a explicações biológicas de condutas consideradas como socialmente indesejadas. Referimo-nos, inicialmente, aos estudos realizados pelos higienistas de início do século, cujas explicações estavam centradas no caráter orgânico e inato dos desvios, para continuar logo com os recentes estudos da neurociência que se propõem a localizar as condutas nas sinapses inadequadas e nas explicações referidas a deficiências químicas do cérebro.
Palavras chave: localização cerebral; herança; determinismo biológico.
Recebido em: 31/08/2006.
Aprovado em: 15/02/2007.
PHYSIS: Rev. Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, 17(2):343-352, 2007
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Sandra Caponi
A tendência de construir explicações biológicas para comportamentos considerados socialmente indesejados, tais como o alcoolismo, o sentimento de tristeza ou melancolia (que hoje chamamos depressão), a infância problemática
(que hoje recebe o diagnóstico de DDA – Distúrbio de Déficit de Atenção), ou a violência, caracterizou grande parte do discurso da Higiene e da Medicina
Legal no final do século XIX e início do XX.
Sabemos que o determinismo biológico de início do século XX insistia no caráter orgânico e hereditário dos comportamentos considerados indesejados. Mas essas explicações, longe de desaparecerem, parecem ter adquirido poder ainda maior no final do século XX e início do XXI. Assim, a partir dos anos 1980, podemos ver reaparecer, com força inesperada, estudos que, a partir das Neurociências, da Genética ou da Sociobiologia, retomaram as antigas preocupações referidas às “condutas indesejadas”, criando novas estratégias explicativas que reiteram muitas das teses do determinismo biológico clássico.
Essas novas estratégias deterministas