REVOGAÇÂO
Adrian Sgarbi**
A realidade gosta das simetrias e dos leves anacronismos
(Jorge Luis Borges - O Sul).
Introdução
Nesta passagem do último conto de «Artifícios», que data de 1944, mas inserido e anotado em pós-escrito de 1956, Borges favorece a percepção de algo que seria absolutamente inusitado se não fosse expressão de um desconcerto aqui assumido preambularmente: o fato de que a perfectibilidade desejada para os modelos normativos não coaduna com a imperfectibilidade de seus criadores.
Como se sabe, o “egresso” de normas de um conjunto normativo é ocorrência tão trivial em um sistema dinâmico como o “ingresso” de normas. Porque a regência tanto do primeiro fenômeno normativo quanto do segundo decorre de, ao menos, dois fatores convergentes e muito banais: 1) a necessidade de ajustes em relação às prescrições já editadas e 2) a presença de certa categoria de normas cujo propósito é regular a atividade produtiva do direito em sua indivisa imagem de expandir e retrair quantitativamente os materiais jurídicos.
Em termos mais específicos, o argumento único deste ensaio referese a “eliminação de normas”. Entretanto, formas diversas existem de
“eliminar normas” 1, de maneira que cumpre dizer que apenas um mecanismo de modificação jurídica será examinado, e mesmo assim, no
* Texto de comentário, in Mesa Redonda “O Fenômeno Normativo” (2005/2º semestre).
** Doutor em Direito pela USP. Professor de Direito Constitucional e Teoria do Direito dos
Programas de Graduação e Pós-graduação da PUC-Rio. E-mail: asgarbi@jur.puc-rio.br.
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A revogação, a “anulação” e o “fim de prazo ou ocorrência de circunstância” são as variações principais de egresso normativo.
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Direito, Estado e Sociedade - v.9 - n.29 - p 14 a 27 - jul/dez 2006
que lhe há de surpreendente. O foco de nossa atenção é a “revogação” e o surpreendente é o seu “malogro”.
Convém adiantar o dado que “revogar”, em acepção básica – fazendo-se