Reinvenção - cecília meirelles
A vida só é possível reinventada. Anda o sol pelas campinas e passeia a mão dourada pelas águas, pelas folhas...
Ah! tudo bolhas que vem de fundas piscinas de ilusionismo... — mais nada.
Mas a vida, a vida, a vida, a vida só é possível reinventada. Vem a lua, vem, retira as algemas dos meus braços.
Projeto-me por espaços cheios da tua Figura.
Tudo mentira! Mentira da lua, na noite escura.
Não te encontro, não te alcanço...
Só — no tempo equilibrada, desprendo-me do balanço que além do tempo me leva.
Só — na treva, fico: recebida e dada.
Porque a vida, a vida, a vida, a vida só é possível reinventada. A personagem sente-se insatisfeita com a mediocridade de como a vida tem se manifestado a ela, dado a uma rotina extremamente previsível e à ilusão como bolhas que surgem no fundo da alma e que ao chegarem à tona da realidade desaparecem por completo, provocando uma frustração na alma da sonhadora.
Num momento de lucidez, ela se dá conta de que a vida, para valer a pena, terá que ser mudada radicalmente, ou seja, reinventada.
Conscientizando-se de que a lua, até então musa inspiradora de sua ilusão, é na verdade sua inimiga. Passa então a lutar internamente para se livrar de suas algemas. Busca desesperadamente a ajuda de um ser superior, representado pela palavra “Figura”, mas revolta-se ao não ter sua resposta em forma de livramento: “Tudo mentira!”. Por fim, como uma forma de desabafo, acusa a lua por sua desilusão e pela escuridão em que está envolta sua vida: “Mentira da lua, na noite escura.”.
Ao dar-se conta da realidade, de que a vida que ela levava até então é uma mentira, sente que uma mudança radical se faz necessária e justifica: “Porque a vida, a vida, / a vida, / a vida só é possível / reinventada.”.
Cláudio