Racionalidade Perdida
Introdução
Durante a ditadura, uma série de surveys eleitorais, feitos com a participação de vários dos mais destacados cientistas políticos brasileiros, revelou uma realidade preocupante: as avaliações das questões políticas nacionais mais prementes que caracterizaram aquele regime tinham correlações baixas umas com as outras e baixas ou modestas tanto com as preferências partidárias quanto com as intenções de voto. As avaliações dos serviços públicos e das políticas públicas que são características dos níveis estadual e municipal tinham correlações ainda mais baixas umas com as outras e também com com as preferências partidárias, assim como com as intenções de voto. Esses resultados geraram, entre os cientistas políticos e sociais brasileiros, várias indagações e uma preocupação: como o voto não estava ligado ao desempenho governamental, passava a ser desnecessário governar bem. Os diagnósticos e prognósticos eram sombrios porque sem cobrança não há accountability. Porém, para leigos, sobretudo de direita, esses resultados geraram certezas: o eleitor brasileiro era "irracional" e, se pudesse votar para presidente e governador, escolheria os mandatários a partir de critérios emotivos, irracionais, sendo presa fácil de qualquer demagogo de esquina. Pior, a cabeça do eleitor brasileiro seria um caos: ele não juntaria coisa com coisa. O eleitor seria pré-ideológico e a cultura política brasileira seria pré-cívica. Estas posições elitistas são antigas no Brasil e os dados das pesquisas eleitorais vieram reforçá-las, contra o ideário democrático dos pesquisadores.
Em 1978, no início da distensão, Bolivar Lamounier estudou as relações entre avaliações do desempenho governamental e preferência partidária no município de São Paulo, por nível educacional. Lamounier selecionou cinco áreas de avaliação (atendimento médico no INPS, custo de vida,