Psicologia
e é como uma tentativa de substituir a falha da instauração da fantasia inconsciente que o psicótico construirá seu delírio. O delírio é, na psicose, uma tentativa de suplência da não-instauração da fantasia fundamental.
A grande reviravolta que Freud operou em relação à concepção psiquiátrica das psicoses foi a de enunciar que o delírio não é a psicose, mas, ao contrário, a tentativa de cura da psicose. Ou seja, o delírio é a tentativa, mais ou menos exitosa — mais exitosa na paranóia, quando ele comparece de modo sistematizado,
4 e menos exitosa na esquizofrenia —, de reconstituir este verdadeiro filtro da fantasia que opera na neurose de modo a proteger o sujeito do encontro com o real em jogo na pulsão de morte.
Pode-se compreender melhor, desse modo, aquilo que Freud se empenha em elaborar nos dois famosos artigos de 1924, “Neurose e psicose” (1924a/1996) e
“A perda da realidade na neurose e na psicose” (1924b/1996): a perda que está em jogo aí, para Freud, não é tanto a da realidade, que, de fato, é perdida não só na neurose como também na psicose (como ele se apressa em retificar no segundo artigo, escrito apenas alguns meses depois do primeiro), quanto a da fantasia no caso da psicose. O encaminhamento dado ao conjunto dos dois artigos sugere isto, tanto mais quanto Freud os encerra postulando, ao final do segundo, o lugar central ocupado pela fantasia na neurose e pelo delírio na psicose (1924b/1996,
p.196-7). Freud conclui aí que, se a perda da realidade é comum à neurose e à psicose, o modo de substituir a realidade perdida é que será diferente em cada uma das duas estruturas: “O novo mundo externo, fantástico, da psicose quer substituir a realidade externa; por sua vez, o da neurose, prefere ligar-se, como o brinquedo das crianças, a um fragmento da realidade [...]” (FREUD, 1924b/1996, p.197).
Digamos, então, que o primeiro despertar promovido por Freud se deu em relação ao inconsciente, cuja “via régia” foi aberta