portugues: pessoa ortonimo
Autor: Rafaela Pascoal Teoria do Fingimento
Fernando Pessoa rejeita não só a poesia como manifestação directa de sentimentos, como também recusa a poesia comprometida com fins morais ou sociais. A poesia de Pessoa é dramática, pujante, excêntrica e copiosa e exige-lhe a idoneidade de formar múltiplas personagens discrepantes de si próprio e, consequentemente, congeminar e exprimir sentimentos experimentados.
Para Pessoa, um poema “é um produto cerebral” e é resultado da sua recordação. Há, portanto, uma indispensabilidade da intelectualização da sensação e sentimentos para exprimir a arte. Assim, não quer dizer que o poeta não enjeite a “sinceridade de sentimentos”, mas interessa a aptidão do sujeito para erigir novas afinidades com o orbe e dizer o que intelectualmente sente. O fingimento apenas implica o trabalho de exprimir as emoções.
Esta concepção poética, bem patente nos poemas “Isto” e “Autopsicografia”, é da maior importância pois encontra-se na base da formação dos heterónimos e é proveniente de uma grandiosa aptidão de intelectualização da realidade, da sua interiorização, codificação e, ulteriormente, geração de uma nova realidade, mais subjectiva, dissemelhante da realidade preliminar. Compete ao leitor descodificar esta nova realidade codificada pelo “eu”. Assim se concebe um terno de realidades: a sentida/vivida, a expressa e a interpretada.
Em conclusão, subjacente a esta concepção de arte, está um carácter com forte propensão para a despersonalização e fragmentação, para a proliferação, associada a uma riquíssima fantasia e a algumas perturbações neurológicas e também emocionais, visto que o próprio Pessoa se avocava abertamente como um histeroneurasténico.