Multiculturalismo
Marcelo Paixão
RAÇA, ENQUANTO realidade biológica, inexiste. Isso implica que o ser humano, portador de diferentes formas físicas e legados culturais ancestrais, forma uma única espécie. Ou seja, tanto faz tanto fez que uma pessoa tenha a pele clara ou escura, os cabelos lisos ou crespos, narizes, lábios e demais caracteres de um jeito ou de outro: essas diferenças não tornam ninguém mais apto ou capaz para a realização de tudo de bom ou de mau que um coração humano comporta. Contudo, essa constatação informa pouco o que se esconde por trás do tema da diversidade e do multiculturalismo. Pois se raça não existe, por que então debater sobre relações raciais?
O fato é que a realidade biológica não pode ser utilizada como único vetor para o entendimento do problema das relações entre seres humanos de aparências diferentes. Quando falamos em relações raciais, não estamos apontando um termo que diga respeito à natureza, mas sim aos modos pelos quais os seres humanos, de diferentes partes do mundo, estabeleceram entre si ao longo da história, relações de dominação econômica, política, cultural e simbólica uns sobre os outros. Assim, se raça não existe, o mesmo não se pode dizer do racismo e do seu primo irmão, o etnocentrismo. O racismo não somente existe como forjou ideologias que, em primeira e última instância, legitimaram múltiplos modos extremamente perversos de exploração (e a escravidão é apenas a sua forma mais estúpida, mas não única), humilhação e violência contra povos de todo o mundo.
O termo “relações raciais” se funda na constatação da existência de uma efetiva relação de sujeição de seres humanos, ou povos, sobre outros seres humanos, ou outros povos, que, baseados nas aparências físicas e muitas vezes, em atributos culturais ancestrais, acaba justificando ideologicamente seu projeto de dominação. Que tais fundamentações fantasiosas da realidade se forjem em mitos teológicos –