Mario de Andrade
Seis horas lá em São Bento.Os lampiões fecham os olhos de repenteÀ voz de comando dos sinosA madrugada imensamente escuraAbafa as arquiteturas da praça.E a estátua de Verdi também, graças a Deus.Mãos nos bolsosGrupinhos entanguidosEncafuados nas socavas dos andaimesOs reservistas que nem malfeitores. Dlem! Dlem!... “SANT’ANA”Vem vindo a procissão com tocheiros e luzesE principia o assalto agitado sem vozes. Anticlericais! Fora estandartes andores! Desaparecem os padres da noite. As filhas de Maria das neblinas Espavoridas pelo Anhangabaú...Assaltantes equilibrados nos estribos.Estilhaço me fere nos olhos o sangue da aurora.Risadas. Chamados. Cigarros acesos. Incêndio! Extermínio! Vitória completa...Faz frio de geada esta manhã...A gente se encosta nos outros pedindoUma esmolinha de calor.E o bonde abala sapateando nos trilhosEm busca das casernas sinistras cor de chumbo.
Na “Advertência” dessa obra, ele afirma: “[...] É um diário de três meses a que ajuntei uns poucos trechos de outras épocas que o completam e esclarecem. Sensações, ideias, alucinações, liricamente anotadas. Raro tive a intenção de poema quando escrevi os versos sem título deste livro. [...]”
Mário de Andrade, in Losango Cáqui·.
ANÁLISE DO POEMA
Tema: a noite
Espaço: bairro São Bento em São Paulo
Igreja e praça
Tempo: 1922 / Século XX
Seis horas lá em São Bento.Os lampiões fecham os olhos de repenteÀ voz de comando dos sinosA madrugada imensamente escuraAbafa as arquiteturas da praça.E a estátua de Verdi também, graças a Deus.
Jovens que estão na praça resguardados pela obscuridade, ficam descobertos quando a claridade chega a eles com os lampiões e com a madrugada os sons da catedral com seus sinos.
Mãos nos bolsosGrupinhos entanguidosEncafuados nas socavas dos andaimesOs reservistas que nem malfeitores. Dlem!