literatura

Alameda Bom Jardim (notas sobre um suicídio)

_ Ma ri e ta, Maaaaa-riiiii-eee-taaa, repetia pausado, observando a divisão exata das silabas e uma ou outra evidência sonora que lhe agradasse. Moradora do 501, em um prédio localizado na alameda Bom Jardim. Vivia sozinha, tendo posse de uma geladeira, uma televisão, uma cama, cômoda, e dois vasos de beijo cor-de-rosa. Saía as sete para o trabalho, chegava às seis da tarde, passava na padaria e comprava sempre duas roscas açucaradas com essência de baunilha. Engolia as roscas com água, o estômago fraco não lhe permitia cafés ou refrescos. Mas a quantidade de açúcar, que Marieta não abria mão, lhe causava certo desconforto, fazendo-a crer que talvez fosse diabética. Procurou um médico, e feitos alguns exames constatou que não tinha nada. Marieta voltou pra casa, não sabendo se a possibilidade de tomar insulina a deixava triste ou feliz. Em um domingo à tarde, revirando algumas gavetas, encontrou alguns livros. Foi aí que decidiu trocar a novela das sete por uma leitura. Achava a ideia fantástica, e leu tudo que encontrou durante alguns dias. Tinha uma predileção por poemas, assim como tinha pela tristeza. Reparou por acaso a morte precoce dos seus poetas, e quis por bem, morrer. Eram almas sensíveis como a dela, que assim como ela não suportavam o enorme fardo da vida, refletiu. Marieta pensou em algumas doenças, não tendo nenhuma, decidiu adquiri-las. Pensou em tuberculose, via em uma propaganda na TV, que se não tratada pode matar. Andou por meses descalça na cerâmica fria do apartamento, tomava banhos frios com a janela aberta e quando sentia um prenuncio de tosse, o sorriso tornava ao seu rosto e desmoronava em semanas ao constatar que a tosse não tinha catarro, nem sangue. Desistiu de ser tísica em uma noite, quando ao ouvir a estação de rádio 97,7 FM, onde às sete horas da noite transmitia-se um programa com músicas francesas. Marieta ficou maravilhada. Pesquisou sobre a França, e até se lembrou de um