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Elder Dias*
“Há um menino, há um moleque, morando sempre no meu coração/
Toda vez que o adulto balança ele vem pra me dar a mão/
Há um passado no meu presente/O sol bem quente lá no meu quintal...”
(Milton Nascimento)
Pré-história
Confesso que nunca quis entrar no Aplicação. Desde pequeno, sempre fui muito resistente a mudanças na minha rotina. E minha rotina escolar, naquele fim de 1981, quando meu pai falou que ia tentar o sorteio no CA, era de três anos no Educandário Professora Valentina, em Campinas, com o ambiente que eu já conhecia, com meus amiguinhos já todos selecionados, com minha fama de bom aluno formada na escola desde o prezinho até o fim daquela 2ª. série Agora, meu pai me dava a notícia de que eu iria ser inscrito no tal sorteio para novos alunos do Aplicação.
Engraçado, faz quase 30 anos, mas eu me lembro exatamente onde meu pai me falou isso: era à tardezinha e estávamos subindo a rua que liga o Educandário Professora Valentina (depois Educandário Campinas, depois Colégio Anglo e depois... não sei mais), no caminho para o pequeno escritório de contabilidade dele, na Rua Senador Jaime. De lá, após ele terminar o expediente, a gente sempre pegava o ônibus 174, linha Campinas-Campus, da Viação Reunidas, que tinha, à época, o pior elenco do transporte coletivo da cidade, disso me lembro ainda e nunca me esquecerei, por motivos pessoais que talvez eu cite à frente – não sei como esse texto vai se desenvolver, estou somente deixando o “espírito santo” fazer o serviço para mim, como escreveu uma vez Jorge Luis Borges.1
O fato é que eu não tinha dúvida de que seria sorteado. Meu destino estava já selado por minha inocência fatalista: não escaparia do Aplicação!
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Ex-aluno do Cepae. Mestre em Estudos Linguísticos pela UFG. E-mail: elderdias@yahoo.com. br 184 Revista Solta a Voz, v. especial
Sala & recreio
Penso que foi em um belo meio-dia de janeiro de 1982 que meu
pai