Fotografia
Em vez de voltar para Moçambique, comprei uma passagem para o Quênia, a única maneira de chegar a Ruanda. Dirigi-me à sede da UNHCR. Ali, explicaram-me que eu não poderia mais entrar em Ruanda: uma guerra eclodira, dezenas de milhares de pessoas fugiam para a Tanzânia. Sugeriram-me que pegasse um avião naquela mesma noite para esse país fronteiriço. Quando desembarquei no nordeste da Tanzânia, 100 mil refugiados já estavam lá. Em poucos dias, eles eram 1 milhão. Quanto aos mortos... Em 1994, lembremos, Ruanda foi palco de um dos maiores genocídios do século XX. Em meio àquele desastre, comecei a trabalhar imediatamente. Vi coisas terríveis; algumas, inesquecíveis. Vi dezenas e dezenas de cadáveres passando por baixo de uma pequena ponte. Havia uma queda-d’água de onde caíam corpos sem parar, e que depois entravam num turbilhão. Era horrível.
Aqueles tútsis me disseram: “Temos um carro, podemos levá-lo a Kigali, se você quiser”. Aceitei. A estrada estava apinhada de corpos mutilados, retalhados. Quando fazíamos pausas na viagem, caminhávamos por entre cadáveres empilhados sob as bananeiras. Tirei fotografias terríveis. A guerra havia eclodido por pretextos étnicos. Mas, para além dela, havia algo mais: uma história de pobreza. De exploração. Uma história que eu conhecia havia muito tempo. Em 1971, visitei Ruanda pela primeira vez, a serviço da Organização Internacional do Café. Voltei em 1991, para o Projeto Trabalhadores, para rever as plantações de “chá aldeão”. Eu tinha visto os pequenos produtores trabalhando de manhã até a noite a preços negativos para produzir um chá que seria o melhor e o mais caro do mundo. Depois de 1971, aquela produção havia se multiplicado por dez, de modo que sua parte dos lucros era cada vez maior. Além disso, em 1975, época do surgimento do Movimento Republicano Nacional pelo Desenvolvimento, um governo muito rígido, a França havia assinado um acordo de assistência a Ruanda, sob o pretexto de proximidade e