Formas de tratamento
Isabel Margarida Duarte
(Faculdade de Letras da Universidade do Porto) (Centro de Linguística da Universidade do Porto)
RESUMO
O ponto de partida para esta reflexão é a dificuldade, para um estrangeiro que aprende o português mas também para muitos locutores que o falam enquanto língua materna, de utilizar adequadamente as formas de tratamento em português, dada a sua complexidade, como variadas vezes mostraram os trabalhos de Maria Helena Carreira (1997, 2001, 2002, 2004, 2007). A partir de um corpus de ficção, veremos as vantagens, para chegarmos a uma abordagem didáctica eficaz, de cruzar o olhar da linguística (quer do ponto de vista do léxico quer do discurso) disciplina que descreve essas formas, com o da literatura, uma vez que a ficção narrativa as usa por vezes de modo muito eficaz. Com base no original português e na tradução francesa do romance de José Saramago, O Ano da Morte de Ricardo Reis (1984), reflectiremos sobre o modo como foram traduzidas as formas de tratamento, para daí tirarmos algumas conclusões. PALAVRAS-CHAVE: linguística, literatura, léxico, discurso, formas de tratamento, português europeu.
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matraga, rio de janeiro, v.18, n.28, jan./jun. 2011
Isabel Margarida Duarte
1. Complexidade das formas de tratamento em Português Europeu: três aspectos
A complexidade do uso das formas de tratamento em português origina múltiplas dificuldades e de diverso teor. A maior parte delas é de tipo pragmático e decorre de o locutor não saber adequar a forma própria ao destinatário que com ele se relaciona social e linguisticamente. Mas, para que o locutor saiba empregar a forma adequada por meio da qual se deve dirigir ao alocutário, tem de possuir, no seu acervo lexical, um conjunto rico e variado de alternativas pelas quais possa optar, depois de avaliar devidamente a situação enunciativa, o estatuto e a relação entre os interlocutores entre os quais decorre a troca