Foco narrativo do livro vidas secas
Foco narrativo Vidas Secas é o único romance de Graciliano Ramos que é narrado na terceira pessoa. A presença discreta do narrador onisciente e sua extrema precisão nas descrições das paisagens por si só constituem um traço marcante e distintivo na estrutura do texto. O narrador assume uma posição de não interferência em relação ao fato narrado. Sem se preocupar com qualquer julgamento, ele simplesmente se resigna em “mostrar” a cena tal como acontece, dando ao leitor a impressão de que se está diante de um filme.
Observemos o início do primeiro capítulo, Mudança, onde essa sensação transparece nitidamente e aos olhos do leitor vai se compondo o cenário silencioso de uma paisagem seca que envolve o andar necessário da família de Fabiano: “Na planície avermelhada os juazeiros alargavam duas manchas verdes. Os infelizes tinham caminhado o dia inteiro, estavam cansados e famintos. Ordinariamente andavam pouco, mas como haviam repousado bastante na areia do rio seco, a viagem progredira bem três léguas. Fazia horas que procuravam uma sombra. A folhagem dos juazeiros apareceu longe, através dos galhos pelados da caatinga rala”. 7
O distanciamento que o narrador guarda sobretudo em relação à paisagem poderia representar um sério problema na caracterização íntima das personagens, já que estas são marcadas por uma quase ausência total de comunicação. Lançando mão do chamado discurso indireto livre[1], Graciliano resolve o problema, dando ao narrador a possibilidade de este, sempre sem interferir nas escassas reflexões das personagens, extrair destas os pensamentos, os desejos, os sentimentos que elas não conseguem verbalizar, tamanho o grau da dificuldade comunicativa.
O uso do discurso indireto livre possibilita ao narrador de Vidas Secas dar voz às personagens. Vejamos um pequeno trecho, extraído do capítulo Cadeia, onde Fabiano, inconformado com sua prisão, reflete sobre o fato de estar preso. Perceba que, no