Estudante

Capítulo 2 Dormir pode ser um alívio, mas os embriagados sabem muito bem que ao despertar, a aflição se agrava. E eu estava embriagado com a cegueira, não dos olhos, de algo mais profundo. Meu maior desejo naquele momento era poder dormir até que me desintegrasse, até que não existisse mais. Meus olhos ainda lacrimejavam e ardiam, meu pescoço e meus ombros doíam como se tivesse passado o dia apanhando. Eu sentia um gosto amargo. O enjoo ainda permanecia. Levantei da poça de suor onde me encontrava, a claridade da janela vindo da rua com seus poucos postes iluminados refletia no meu quarto com uma pálida e fria luz laranja em meio a escuridão. Fiquei sentado ali, fitando o chão, sem propósito. Vesti o casaco, ainda suado, não importava. Caminhei devagar pelo corredor, parando em frente ao quarto de Jamille. A porta entreaberta, eu podia ver seu rosto sereno e cansado escondido entre os lençois, ela não merecia carregar todo aquele peso, talvez ela também se perguntasse todas as manhãs “Por que eu?”. Desci silenciosamente as escadas e abri a porta dos fundos. Dei a volta no jardim e subi a pequena escadinha que dava para o telhado. Eu gostava de ficar lá as vezes, quando estava sem rumo. Ali eu podia ver toda a vizinhança e a névoa clara que pairava pelas casas e as ruas vazias apenas com postes de iluminação intercalados que zumbiam de vez em quando. Em Resonvell, os dias eram animados e sorridentes para a maioria, com o cheiro do café esvoaçando pelas cozinhas. Mas ela tinha dois lados. À noite, as famílias trancavam as portas, puxavam as crianças para perto e calavam-se. Alguns mais corajosos espiavam o que quer que estivesse escondido ali nas sombras, mas nunca viam nada. O meu rosto quente recebia a brisa de bom agrado. Apoiei as mãos nas telhas e deixei as pernas penderem ali no ar. De repente, senti algo formigando em minha cabeça, uma sensação que eu comecei a sentir ultimamente. E então uma voz, no começo fraca, mas depois ganhando força.