Entrelaçamento literário afro-brasileiro
Elisalva de Fátima Madruga Dantas Jogo de apropriação estética das palavras, a literatura, como bem o observa Maria Aparecida Baccega, “constrói, destrói e reconstrói realidades, apropriando-se da palavra que pulsa na materialidade do intercâmbio da vida social.”(* Professora da Universidade Federal da Paraíba BACCEGA,Maria Aparecida. “História e arte. Reflexões sobre a literatura angolana”In: Revista USP. Dossiê Brasil/África.n. 18, 1993, p. 136.) Impulsionadas pelo desejo de criar uma nova realidade em contraposição àquela imposta pela política colonizadora, as literaturas africanas de língua portuguesa, no seu início, surgem marcadas pelo signo da utopia, da contracultura. É esse viés contracultural e utópico que aproxima essas literaturas, da literatura brasileira, sobretudo dos poetas e escritores que, nos anos 20 e 30 do século XX, contribuíram para a consolidação de uma identidade cultural brasileira, ao reagirem de modo sistemático aos paradigmas sócio/culturais vigentes, calcados no quadro de referências herdadas da cultura colonizadora. Afinal, muito mais que nós brasileiros, os africanos sofreram na pele o processo de desterritorialização, vendo-se abruptamente inseridos em um outro universo, no qual sua língua, suas matrizes míticas, seus costumes foram rechaçados e substituídos impositivamente pelos da cultura do povo dominador. Trazê-los de novo à cena colocava-se como condição sine qua non para o processo de reterritorialização. Urgia, como propôs, entre nós, Oswald de Andrade, transformar o tabu em totem. Ressacralizar o que fora dessacralizado. Transformar, portanto, o valor oposto em valor favorável. Urgia, pois, restabelecer o espaço africano, preencher os vazios provocados pela desterritorialização, voltando-se para o local, para o cotidiano, na busca da reconstrução da sua singularidade, daquele traço “uno” que, sobrepondo-se às divergências locais internas, assinalaria, no concerto das nações,