Ensaio sobre a cegueira
Walter Praxedes No romance Ensaio sobre a cegueira (1995), de José Saramago, a cegueira descrita é representada através de inúmeras metáforas. Já no início da narrativa as personagens são acometidas pelo chamado "mal branco", impossível de ser diagnosticado como um dos tipos já conhecidos de cegueira. Considerando a cegueira como metáfora, ao longo deste romance Saramago tenta explicar como as pessoas vão se tornando cegas no mundo contemporâneo, como inexplicavelmente ocorreu com o primeiro cego, primeira personagem apresentada na narrativa, que cegou quando conduzia o seu automóvel: de repente a realidade tornou-se indiferenciada à sua volta.
Quando o "primeiro cego" chegou ao consultório do oftalmologista para tentar descobrir uma solução para o seu problema de visão, o médico considerou o caso urgente e passou-o à frente dos demais pacientes que aguardavam pela consulta. Porém, a mãe de um menino que aguardava sua vez não se sensibilizou diante da urgência do paciente inesperado e "...protestou que o direito é o direito, e que ela estava em primeiro lugar, e à espera a mais de uma hora. Os outros doentes apoiaram-na em voz baixa, mas nenhum deles, nem ela própria, acharam prudente insistir na reclamação, não fosse o médico ficar ressentido e depois pagar-se da impertinência fazendo-os esperar ainda mais" (EC: 22).
A pressa e insensibilidade desses pacientes diante de um indivíduo com um problema considerado mais urgente pelo médico talvez seja um primeiro indício apresentado pelo narrador de que a cegueira pode ser provocada pelo distanciamento existente entre os indivíduos nas sociedades modernas. Um distanciamento que leva cada um a observar apenas os seus próprios interesses, interesses tais que só serão limitados pelo cálculo da conveniência: "...na verdade, sentencia o narrador deste romance, ainda está por nascer o primeiro ser humano desprovido daquela segunda pele a que