encontrando ela
Era uma manhã cinzenta de quarta.
Era cedo, mas não tão cedo.
Tinha passado na exposição do Eikoh Hosoe, ainda estava com aquela euforia contrastada no peito, uma dor que se fica quando se ver algo belo, pelo menos assim fico. Acho que fui a primeira a entrar na sala naquele dia.
Saí. Segui para um Café que fica entre a Consolação e a Rua Sergipe. Caminhei por uns 20 minutos, ao som de “A Love Supreme”, do John Coltrane. Reparei que as pessoas te olham com um fone de ouvido e algumas parecem adivinhar o que você está ouvindo. Isso porque te julgam ou não com uma simples expressão, assim penso na minha lucidez atemporal. Mas nada isso importa, não por enquanto.
Cheguei. Escolhi um banco no fundo do Café, em um lugar menos acessível. Mas quase todos os outros lugares estavam desocupados. Tinham duas pessoas além de mim no ambiente: A garçonete e um senhor lendo um jornal numa poltrona perto a entrada.
A garçonete veio. Pedi um expresso duplo e um bagel.
Agora folheava o panfleto da exposição, e toda aquela irracionalidade, sensualismo fotografado, me questionava sobre a exatidão da arte e sobre sua postura numa obra tão perspicaz. Um trabalho realmente atraente.
Meu pedido chegou. Comi o bagel e bebi o café devagar.
De repente, do nada, surge uma moça, passa por todos os pufs e cadeiras vazias e senta na minha frente. Achei bem estranho, pra falar a verdade me incomodou.
Num rápido olhar que trocamos, a vi melhor. Não pude deixar de notar as bolinhas grudadas no seu pollover ocre. Ela estava com uma garrafa de água mineral na mão direita e uma tatuagem um pouco abaixo da orelha.
E o silêncio tomou conta do ambiente.
Ela ficava balançando a garrafa pra lá e pra cá. E eu podia ouvir o barulho da água fazendo tempestade dentro da pet. Ela abriu a garrafa. E eu pude ouvir o exato momento em que a água chegou em seus lábios e umedeceu-os uniformemente.
Olhei-a num piscar.
Vi seus lábios. Suas sardas claras em cima do nariz. Seu cabelo encaracolado