Dogville
Esteticamente ousado e tematicamente abrangente, o filme de Lars von Trier é um manifesto de falta de fé na humanidade. Expõe de maneira consequente um resumo de todas as misérias humanas e as razões dos seus fracasso. Em “Dogville” não é apenas a sociedade estadunidense que fracassa, mas tudo que a fundamenta: o iluminismo, o humanismo, a religião, a experiência. O filme acontece como uma peça de teatro filmada e é estruturado em capítulos (assim como o teatro é feito em atos), fazendo alusão à Bíblia e seus livros. Toda a história se passa sobre um piso negro em que as riscas de giz representam as paredes das casas. Os atores fingem abrir portas e janelas. Alguns móveis, árvores, carros completam o cenário. Nomes riscados no chão indicam o nome do proprietário da casa em que estão. O teatro se passa nos Estados Unidos na década de 1930, com a depressão e a violência dos gângsteres. O cineasta é um dos autores do Dogma 95, manifesto que tem a intenção de resgatar o cinema anterior à sua exploração industrial segundo os moldes hollywoodianos. O manifesto, também chamado de “Voto de Castidade”, apresenta dez regras de cunho técnico que proíbem acessórios, cenografias e utilização de tecnologias. Os preceitos vão desde a restrição do uso de trilha sonora, truques fotográficos e deslocamentos temporais ou geográficos até a imposição de que a câmera só pode ser controlada na mão. Dogville não é uma produção do Dogma 95, apenas segue alguns de seus regulamentos, como o uso da câmera na mão e a recusa de deslocamentos temporais e geográficos. O filme é repleto de ambiguidades, ironias e provocações, dirigidas não somente aos críticos de cinema, mas também aos espectadores e ao estilo de vida capitalista, em especial o estadunidense (embora seja genérico o suficiente para se encaixar em qualquer sociedade capitalista). A monotonia toma conta da cidade Dogville, até que aparece a jovem Grace, fugitiva de perigosos