Descasos – alexandra szafir
"Um advogado de cadeira de rodas, incapaz de atender ao desembargador que, pela tradição, exige que ele faça de pé a sustentação oral do apelo. Um preso com processo já prescrito, esquecido nos escaninhos da Justiça. O cheiro fétido da prisão que impregna o corpo do réu que se descobre inocente.
É difícil saber o que comove mais, se são as histórias de descasos do sistema criminal que Alexandra Szafir narra ou se é o esforço incomum que ela teve de fazer para contá-las.
Alexandra é advogada criminal muito bem sucedida que, ao lado de seu trabalho em um conceituado escritório, passou anos fazendo serviços voluntários, cuidando de casos de presos em mutirões carcerários.
Da experiência deste trabalho, colecionou as histórias que conta em "desCasos" (Ed. Saraiva), lançado há alguns dias em São Paulo, como uma legítima lição de vida.
No meio de suas escritas, Alexandra foi acometida pela Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA), perdendo paulatinamente o controle sobre seus membros e funções. Primeiro pés, depois, mãos. Enfim, fala e deglutição. Ao final, o livro foi escrito com ajuda de um software que reconhecia a posição de seu nariz, usado como mouse para um teclado virtual.
Difícil não lembrar do emocionante "O escafandro e a borboleta", filme originado do livro homônimo de Jean-Dominique Bauby. O editor da revista Elle, vítima de um AVC, ficou sem qualquer outro movimento voluntário, à exceção do piscar do olho esquerdo. E com esse mínimo pulsar, "ditou" suas memórias.
Mas "desCasos" não deve servir como instrumento de piedade.
A autora não é sua personagem principal. Tampouco é indulgente ou tolerante em suas severas críticas, encaixadas nas dobras das crônicas que narra. O fio condutor é um brado contra o desrespeito e a desumanidade.
Seu olhar de advogada se reveste de uma indignação incontida com os descasos do sistema e não hesita em apontar para a inoperância ou indiferença alheias, que faz, no entanto,