Contos
Uma história de Acção de Graças
Vivia-se bem na nossa aldeia até àquela noite de Outubro em que os soldados vieram. A minha mãe escondeu-nos, à minha irmã e a mim, debaixo da cama. Quando espreitei para ver o que se passava, apenas vi os pés da minha mãe enfiados nos chinelos pretos e as botas grandes e lamacentas dos soldados.
Depois de saírem, o meu pai disse:
— Temos de partir já.
— Porquê? — perguntei.
— Porque não pensamos da mesma forma que eles, meu filho. Despachemo-nos!
O meu pai não nos deixava levar nada à excepção de uma muda de roupa. A minha mãe indignou-se: — Vou ter de deixar todas as minhas coisas? A cadeira onde embalei os nossos filhos, a coberta que a minha mãe fez, ponto por ponto?
— Não levamos nada — tornou o meu pai. — Apenas o dinheiro para comprar a passagem para a América.
A palavra “América” não me era desconhecida, pois tinha ouvido os meus pais murmurá-la em noites inquietas. Seria esse, então, o nosso destino?
Nessa noite, vi pessoas a caminhar em silêncio pelas ruas recônditas e barcos junto ao cais, a balançar na água escura, enquanto homens falavam em segredo e o ouro passava de
bolso em bolso.
— Preciso da tua aliança — disse o meu pai à minha mãe. — E das tuas granadas.
Sem dizer palavra, a minha mãe tirou o anel do dedo e o colar de granadas da bolsinha onde o guardava, depositada no fundo da trouxa que fizera.
O meu pai disse que partiríamos de noite.
— Quantos dias faltam para chegar à América? — perguntou a minha irmã.
— Não muitos — respondeu o meu pai. — Não tenhas medo! — sossegou-a.
O barco de pesca era pequeno, nós éramos muitos e apareciam cada vez mais pessoas.
Quando, por fim, zarpou do porto em direcção ao oceano, o barco ia carregado.
A minha irmã não parava de fazer perguntas.
— Ainda não se consegue ver a América, pai?
— Ainda não — respondia o meu pai.
Estávamos a cerca de uma hora da praia quando os motores pararam. Os homens aglomeraram-se em torno