Conto
Com a realidade a permear-lhe o inconsciente do sono, ele estava se acostumando com a luz do quarto, a luz da manhã. Ainda tinha a cabeça no travesseiro pensado no que fizera e no que não fizera na noite passada. Lembrou que estivera com sua namorada num restaurante. E como um baque em sua vida, no corpo e tudo mais que era, lembrou das palavras da namorada, lembrou e vivenciou, pois aquelas palavras o machucavam. Tudo se deu ao final da refeição, depois que passaram uma hora e meia juntos. Ele sentindo-a fria, programada, contida. Distante. Foi então que ela pediu para conversar. Disse a ele que estava estranha, que tinha uns planos e que não conseguia, por mais que tentasse, ele nunca estava neles. "Acho que estou precisando de um tempo", ela disse. Ele deitado na cama, viu o quanto a noite passada não havia sido agradável.
Levantou-se da mesa e saiu. Com lágrimas nos olhos, ela levantou devagar, contida, sendo uma estranha na mesa. E antes de sair e dar as costas para ele, virou e disse: "Desculpe-me". Ele ficou calado lá, olhando no infinito. Então veio o garçom e perguntou para ele se estava tudo bem. Ele se lembrou de que estava num restaurante. Pagou a conta e foi embora.
Levantou da cama e foi ao banheiro. Assim que pôs os olhos no espelho, algum vizinho maldito colocou umas músicas românticas, "eu tenho tanto pra te falar...". Ele chamou o vizinho mentalmente de desgraçado e mais alguns palavrões. Hoje ele não precisava de um vizinho romântico. Poderia ficar em silêncio. Hoje não, hoje é dia do outro ser feliz, assim como você já foi. Ainda se olhando no espelho, lembrou que no dia anterior ficou andando na cidade com as luzes todas acesas e a solidão como companhia. Poderia ter entrado em algum bar, ter enchido a cara de álcool. Mas não, sentou numa praça da cidade e chorou. Como quem não tinha mais chão, vida e ar pra respirar. Se afogava nas suas