Conto

837 palavras 4 páginas
Conto

Chegou em casa no crepúsculo, a luz amarelada batendo nas paredes de tinta carcomida e suja tinha gosto de frustração, lembrou-se de quando queria pintá-la de azul, mas nunca o fez. Chamou pelo cachorro, preguiçoso não veio atendê-la, talvez porque soubesse que estava sozinha, mas sua presença malcheirosa estava ali na porta de entrada. Abriu a porta vagarosa e logo viu que a mãe passara por ali, tirando a poeira e organizando as roupas – teve vontade de gritar – mas sorriu docemente em agradecimento aos cuidados maternos, A casa parece muito espaçosa agora, joga as bolsas e livros na cama e pensa “Como pode ter tantas cobertas e mesmo assim ser fria quando me deito?”.
Acende um incenso para tirar o cheiro de solidão. Abre as cortinas da cozinha e a janela da biblioteca, mas o crepúsculo acabou e agora uma fria sensação de passado invade a casa.
Ela se lembra do cachorro, abre a porta dos fundos, lá está ele, abanando o rabo e olhando com seus olhos de mel, parece que sente seu vazio e vem acarinha-la. Ela o afaga e canta... De onde surgiu esta canção? “Sou rosa vermelha, ai meu bem querer, beija flor sou sua rosa, sua escrava até morrer ...”. Ela tenta outra, “ Porque eu preciso dizer que te amo, te ganhar ou perder sem engano”, ela pensa “Deus! Porque estas canções?” “ Não posso cantar isso pro cachorro”, “Vamos tentar algo com menos gosto de lembrança, mais animado”: “Que falta eu sinto de um bem, que falta me faz um xodó, mas como eu não tenho ninguém...”
Desistiu. Pegou pá e vassoura e foi limpar a sujeira da frente da porta, teve frio, alimentou o cachorro e depois fechou a porta diante de seus olhos de mel, ávidos por mais carinho, mas ela não podia mais cantar.
A noite agora era pesada, lançou o olhar sobre seu corredor aceso, a luz amarelada parecia uma mentira, foi apagá-la e acendeu a luz branca e muito forte da cozinha. Se sentiu num hospital.
O incenso apagara e deixara um cheiro de queimado amargo no ar.
Percebeu que estava

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