Conciencia
Valter Guimarães Soares1
A estória não quer ser história. A estória, em rigor, deve ser contra a História. A estória, às vezes, quer-se um pouco parecida à anedota.
Guimarães Rosa - Tutaméia
O passado é, também, uma ficção do presente.
Michel de Certeau – A escrita da história
O segredo da verdade é o seguinte, não existem fatos, só histórias.
João Ubaldo Ribeiro – Viva o povo brasileiro
Neste ensaio problematizo a relação entre história e literatura. O tema é controverso e carregado de historicidade, razão porque este escrito deve ser tomado como um índice ou introdução de um campo de estudos ainda em processo de aprofundamento. Anuncio aqui uma primeira inscrição, um provisório registro de impressões.
Se hoje o cruzamento entre história e ficção está na ordem do dia, o que se explicita pela retomada da história pelos estudos literários (“novo historicismo”) e pelo interesse da “nova história cultural” pelas questões que envolvem a linguagem, tal relação nem sempre se deu de forma harmoniosa. Pelo contrário, houve momentos em que eles (os termos) sequer existiam na acepção que os entendemos atualmente. Em outros, não existiam fronteiras definidas entre estória e história. Também ocorreram intervalos em que as fronteiras se fecharam, estabelecendo-se limites definidos entre o que seria ficcional e o que seria científico.
Nas últimas décadas do século XX, estas fronteiras voltaram a se abrir, mas sempre de forma polêmica. No caso dos historiadores, as posições são divergentes e muitas vezes opostas. Por um lado, a literatura pode ser tomada como fonte para interpretação histórica, como documento a ser lido e desconstruído, à semelhança de um processo crime ou de um inventário. Por outro, numa postura mais ousada do ponto de vista epistemológico, tem sido tomada como representação e dizer instituidor da realidade, da História, marcando algumas diferenças, mas sobretudo aproximando os dois discursos. A