Cidade Ilhada
Vera Helena Picolo CECCARELLO2
Nenhum homem é uma ilha, inteiramente isolado, todo homem é parte do continente, uma parte de um todo.
John Donne (2007)
Uma cidade que representa o distanciamento, a solidão, a incomunicabilidade e as dificuldades de relacionamento entre o eu e o outro. Tentativas de se viver uma língua diferente, tentativas de se lidar com a morte. Temas como esses são desenvolvidos por Milton Hatoum em A cidade ilhada e dão unidade a seu mais recente livro. Manaus é aqui uma cidade literária que se perde e se encontra nos labirintos da memória do autor e dos personagens.
Após sagrar-se como importante romancista no cenário literário brasileiro com os premiados romances Relato de um certo oriente (1989), Dois Irmãos (2000),
Cinzas do norte (2005) e a novela Órfãos do eldorado (2008), Milton Hatoum faz sua primeira publicação na forma de contos, irrompendo, assim, a contracorrente dos escritores nacionais. Dos catorze contos reunidos em A cidade ilhada, seis são inéditos no Brasil e o restante engloba publicações em jornais, revistas, antologias, aqui e no exterior, numa mescla de biografia e ficção, ambientados tanto em Manaus quanto fora do país.
Apenas dois contos – “Bárbara no inverno” e “Encontros na península” – não se referem diretamente a Manaus. Vale salientar como a cor local manauara aflora nas entrelinhas dos contos de Hatoum, como também se evidenciou em seus romances.
Todos os contos, excetuando os dois acima referidos, acentuam tal característica.
Não é, porém, uma descrição naturalista que exalta a opulência natural da região, e sim, um olhar sobre o regional que se combina ao momento interno da narrativa.
Como aponta Antonio Candido (2006b, p.14, grifo do autor), “[...] o externo (no caso, o social) importa, não como causa, nem como significado, mas como elemento
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Resenha da obra: HATOUM, M. A Cidade Ilhada. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.
Mestranda em Sociologia. Unicamp –