Autopsicografia fernando pessoa interpretação
O assunto do poema desenvolve-se em três partes lógicas, que correspondem a cada uma das estrofes.
Na primeira parte, o primeiro verso contém a ideia fundamental do poema, na frase de tipo axiomático "o poeta é um fingidor", que, logo a seguir, é explicado, ou confirmado, por meio de uma particularização centrada na dor.
Quer isto dizer que a poesia não está na dor experimentada, ou sentida realmente, mas no fingimento dela. Isto é, a dor sentida, a dor real, para se elevar ao plano da arte, tem de ser fingida, imaginada, tem de ser expressa em linguagem poética, o poeta tem que partir da dor real, a dor que deveras sente.
Não basta, para haver poesia, a expressão espontânea dessa dor real, tal como o faria, por exemplo, um doente relatando a sua dor ao médico. Não há poesia, não há arte sem imaginação, sem que o real seja imaginado de forma a exprimir-se artisticamente, de forma a surgir como um objectivo poético (artístico), de forma a concretizar-se em arte.
Esta concretização da dor no poema opera na memória do poeta o retorno à sua dor inicial, parecendo-lhe a dor imaginada mais autêntica do que a dor real. É a sobreposição do objecto artístico à realidade objectiva que lhe serviu de base: “chega a fingir que é dor/a dor que deveras sente”. Isto conduz-nos à ideia de fruição artística, da parte do poeta. Na segunda parte do poema, o poeta alude à fruição artística da parte do leitor. Este não sente a dor real (inicial), que o poeta sentiu, nem a dor imaginária (dor em imagens) que o poeta imaginou, ao ser artífice do poema, nem a dor que eles (leitores) têm, mas só a que eles não têm. Isto é, o que o leitor sente é uma quarta dor que se liberta do poema, que é interpretado à maneira de cada leitor.
Há na segunda estrofe referência a quatro dores: a dor sentida (real), a