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Estando pois assim estes dois amantes em seu solaz, Elisena perguntou ao Rei se a sua partida seria breve; e ele disse-lhe:
– E por que, minha senhora, o perguntais?
– Porque esta boa ventura – disse ela – que tanto gozo e descanso deu aos meus mortais desejos, já me ameaça com a grande tristeza e angústia que a vossa ausência me dará, que com ela serei mais perto da morte que da vida.
Ouvidas por ele estas razões, disse:
– Não tenhais temor disso, que ainda que este meu corpo parta da vossa presença, o meu coração junto com o vosso ficará, que a ambos dará esforço, a vós para sofrer e a mim para cedo regressar, que sendo sem ele não há outra força tão dura que me possa deter.
Darioleta, que viu ser tempo de sair dali, entrou na câmara e disse:
– Senhora, sei que outra vez vos agradou mais a minha presença do que agora, mas convém que vos levanteis e vamo-nos, que é tempo.
Elisena levantou-se e o Rei disse-lhe:
– Eu morarei aqui mais do que o possais crer, e isto será por vós; e rogo-vos que não se vos olvide este lugar.
Elas foram-se às suas camas e ele ficou na sua, muito pagado da sua amiga, mas espantado com o sonho que já ouvistes; e, por ele, havia mais vontade de se ir à sua terra, onde havia ao tempo muitos sábios que semelhantes cousas sabiam soltar e declarar1, ainda que ele mesmo soubesse algo que aprendera quando mais moço. Neste júbilo e prazer morou ali o rei Periom dez dias, folgando todas as noites com aquela sua muito amada amiga, ao cabo dos quais decidiu, forçando a sua vontade e as lágrimas de
1 Ou seja, explicar (soltar os sonhos era a