artes
Enfunando os papos,
Saem da penumbra,
Aos pulos, os sapos.
A luz os deslumbra.
Em ronco que aterra,
Berra o sapo-boi:
- "Meu pai foi à guerra!"
- "Não foi!" - "Foi!" - "Não foi!".
O sapo-tanoeiro,
Parnasiano aguado,
Diz: - "Meu cancioneiro
É bem martelado.
Vede como primo
Em comer os hiatos!
Que arte! E nunca rimo
Os termos cognatos.
O meu verso é bom
Frumento sem joio.
Faço rimas com
Consoantes de apoio.
Vai por cinqüenta anos
Que lhes dei a norma:
Reduzi sem danos
A fôrmas a forma.
Clame a saparia
Em críticas céticas:
Não há mais poesia,
Mas há artes poéticas..."
Urra o sapo-boi:
- "Meu pai foi rei!"- "Foi!"
- "Não foi!" - "Foi!" - "Não foi!".
Brada em um assomo
O sapo-tanoeiro:
- A grande arte é como
Lavor de joalheiro.
Ou bem de estatuário.
Tudo quanto é belo,
Tudo quanto é vário,
Canta no martelo".
Outros, sapos-pipas
(Um mal em si cabe),
Falam pelas tripas,
- "Sei!" - "Não sabe!" - "Sabe!".
Longe dessa grita,
Lá onde mais densa
A noite infinita
Veste a sombra imensa;
Lá, fugido ao mundo,
Sem glória, sem fé,
No perau profundo
E solitário, é
Que soluças tu,
Transido de frio,
Sapo-cururu
Da beira do rio...
Manuel Bandeira
Há 91 anos, começava em São Paulo, em pleno Teatro Municipal, a Semana de Arte Moderna de 1922, que sacudiria os cânones da arte no País. O que valia antes não valia mais: outra arte chegara, decretavam os modernistas capitaneados por Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Anita Malfatti, Di Cavalcanti, Menotti del Picchia. Heitor Villa-Lobos apresentaria 20 composições durante as três noites que durou a Semana, escandalizando os puristas ao mesclar música de orquestra a tambores, instrumentos populares de congado e folhas de zinco. Antropofagicamente, como o Brasil faz sua arte até hoje, de Norte a Sul: deglutindo e reprocessando elementos de outras culturas. “Só a antropofagia nos une. Socialmente.