Arcaismos em guimaraes rosa
ARCAÍSMOS EM GUIMARÃES ROSA
(Em memória de minhas avós, Rita e Olympia, e de seu Manuel
Abel, marceneiro de primeira categoria, lá de Taperoá.)
Lívia Suassuna*
RESUMO: No presente texto, tematizamos, inicialmente, a mutabilidade e historicidade da língua, com apoio na concepção de linguagem como fazer histórico, modo de ação sobre o mundo, e na teoria de Eugenio Coseriu sobre a mudança lingüística, esta última apresentada nas suas principais oposições com as clássicas dicotomias saussurianas. Em seguida, procedemos a uma revisão de literatura, com o objetivo de verificar diferentes aspectos do fenômeno do arcaísmo, enquanto manifestação da mudança lingüística e traço estilístico. À luz dos pressupostos indicados, mostramos exemplos de diversos arcaísmos utilizados por João
Guimarães Rosa em duas de suas obras – Grande sertão: veredas e Primeiras estórias. As conclusões de nosso trabalho indicam que os arcaísmos de G. Rosa representam, para além de fotografias da fala popular ou regional antiga, um processo de criação e recriação de significados, concretização do permanente e potencial desequilíbrio da língua, superação do historicamente constituído, sendo isso o que confere estatuto literário à sua obra.
Palavras-chave: língua portuguesa, estilística, arcaísmo, história da língua portuguesa.
“A realidade do ethos de uma obra há que buscá-la na integração de todos os seus elementos, nas interferências, convergências, tensões por eles criadas.” (Dubois e outros, em Retórica geral)
1. MUTABILIDADE E HISTORICIDADE DA LÍNGUA
C
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oseriu (1979) trata da mudança lingüística. Logo no começo de sua obra, chama atenção para o fato de que esse fenômeno não deve ser investigado apenas em termos causais (por que as línguas mudam?), pois essa po-
Universidade Federal de Pernambuco.
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SUASSUNA, Lívia. Arcaísmos em Guimarães Rosa.
sição sugere que as línguas seriam naturalmente