Análise de "olha, marília, as flautas dos pastores
Que bem que soam, como estão cadentes!
Olha o Tejo a sorrir-lhe! Olha: não sentes
Os Zéfiros brincar por entre as flores?
Vê como ali, beijando-se, os Amores
Incitam nossos ósculos ardentes!
Ei-las de planta em planta as inocentes,
As vagas borboletas de mil cores!
Naquele arbusto o rouxinol suspira;
Ora nas folhas a abelhinha para.
Ora nos ares, sussurrando, gira.
Que alegre campo! Que manhã tão clara!
Mas ah!, tudo o que vês, se eu não te vira,
Mais tristeza que a noite me causara.
O soneto parte de uma apóstrofe inicial (Olha, Marília,…), repetida nos versos 3 (Olha o Tejo…) e 5 (Vê…), através da qual o sujeito poético chama a atenção da amada para a beleza da natureza. Essa descrição estende-se ao longo das duas quadras e do primeiro terceto, que podemos considerar como uma primeira parte do poema. Essa descrição destaca, além da música dos pastores, as águas do rio, a brisa ligeira, as borboletas, os rouxinóis, as abelhas, que em conjunto compõem um quadro típico de locus amoenus, caraterístico da poesia neoclássica. A influência neoclássica nota-se igualmente nas referências mitológicas: os Zéfiros, designação clássica de ventos suaves; nos Amores, equivalente a Cupido, entidade mítica associada ao sentimento amoroso; no vocabulário erudito (cadentes, Zéfiros, ósculos). A própria presença dos pastores com as suas flautas é um lugar comum da poesia neoclássica. Não se trata de pastores reais, mas de figuras literárias que contribuem para compor o cenário bucólico).
Para a construção desse cenário, o poeta recorre à personificação do rio (Olha o Tejo a sorrir-lhe), das borboletas (as inocentes / … borboletas), do rouxinol (o rouxinol suspira), bem como à metáfora (brincar, no verso 4; suspira, no verso 9; sussurrando, no verso 11) e à adjetivação (cadentes, ardentes, inocentes, vagas e depois alegre, clara, nas frases-síntese que abrem o último terceto). Além disso, a apóstrofe com que arranca o