África
O sentimento de alteridade relativo ao senhor branco era muito maior do que qualquer diferença entre crenças e hábitos de sociedades africanas, e pouco a pouco, os africanos e seus descendentes foram se reagrupando a partir de afinidades criadas na América, construindo identidades apoiadas em um passado ideal, comum a todos, no qual a terra natal era resgatada por meio de algumas feições gerais, criadas a partir da situação colonial. A África era então retomada de maneira mítica, ponto germinal de onde vinham os significados das coisas, já afastada de uma história concreta e inserida no universo onírico do mito.
Construindo um passado mítico, as comunidades negras na América Portuguesa afirmavam uma identidade forjada a partir do encontro das diferentes culturas africanas, da cultura ibérica e, em alguns casos, das culturas nativas, no contexto da sociedade escravista. Os calundus, candomblés e umbandas são exemplos de produtos culturais mestiços, para os quais convergiram contribuições africanas diversas, elementos do catolicismo popular e do universo indígena. Enquanto essas práticas tinham feições predominantemente africanas, e por isso mesmo eram mais reprimidas, as coroações de reis negros e as congadas eram aceitas no seio das irmandades de leigos, importantes espaços de integração dos africanos e seus descendentes no mundo colonial. Mas apesar de integradas ao catolicismo ensinado pelos senhores, as congadas também remetiam a uma África mítica, central na elaboração de uma dada identidade, de negros católicos.
Por ocasião das festas dos seus santos protetores, os irmãos negros elegiam reis e rainhas que desfilavam em cortejos carregando mantos, coroas e cetros, no que