O QUE É O CAPITAL?
(BERNARDO, João. Capital, Sindicatos, Gestores. São
Paulo: Vértice, 1987, p. 52-53)
“O capital não é dinheiro, nem ações, nem quaisquer outros títulos de propriedade, nem instalações ou máquinas. Nada disso é capital; quando muito, são símbolos ou expressões do capital. Marx conta uma história instrutiva, lida num autor da época, e que me parece ser a melhor alegoria da sociedade contemporânea. Um capitalista britânico pensou que, se era lucrativo exportar tecido para a Austrália, mais ainda o devia ser produzi-los lá. Meteu mãos à obra, adquiriu maquinaria, angariou trabalhadores, comprou víveres e matéria-prima suficiente para arrancar a produção e tudo, homens e coisas, embarcaram para o outro lado do globo. A Austrália de então não era o que é hoje. Enorme ilha pouco povoada, derrotados e em fuga os naturais perante imigrantes europeus ainda escassos, a terra era abundante e livre para quem a quisesse ocupar e explorá-la, cultivando-a ou criando gado. O que os operários deste patrão viajante ficaram a saber logo que desembarcaram, na primeira taberna do porto. “Para quê trabalhar para um capitalista, se cada um de nós pode trabalhar para si próprio?” – pensaram.
E se o pensaram, melhor o fizeram. Na terra que era muita, nas distâncias que eram grandes, transformaram-se esses proletários em pequenos camponeses, nunca mais quem os trouxe lhes pôs a
vista em cima. Arranjar novos operários? Onde, como?
– naquela ilha onde ninguém se assalariava porque todos quantos queriam trabalhavam para si. E assim se desesperava este patrão frustrado, as máquinas tornadas inúteis a enferrujar ao ar ou em qualquer improvisado armazém, a matéria-prima a apodrecer.
Esse algodão ou essa lã, essa maquinaria eram capital?
O seu proprietário era capitalista? Tinham deixado de sê-lo – é isso que nos mostra esta fábula verídica – a partir do momento em que os trabalhadores deixaram de ser operários assalariados e se