José Mattoso traça de um modo claro e compreensivo um quadro conceptual que nos permite lidar com naturalidade e sem dramatismos com o tema complexo da identidade nacional. Em lugar de uma visão centrada apenas no que distingue, esquecida da complexidade e do relacionamento com outras realidades e outras culturas, o historiador assume uma perspectiva aberta sobre a identidade, com os olhos na compreensão das diferenças. E conta-nos que um dia o rei D. Luís perguntou do seu iate a uns pescadores, com quem se cruzou na costa, se eram portugueses; e a resposta foi desconcertante e clara: “Nós outros? Não, meu Senhor! Nós somos da Póvoa do Varzim!”. A resposta dá nota da complexidade do problema. O serem portugueses não lhes pôde ocorrer, quando a pertença à comunidade próxima é que estava presente. O sentimento de pertença afirma-se, assim, pela interpretação dos elos culturais, antes até das considerações de fronteira ou de língua. Se seguirmos os acontecimentos históricos - Reconquista, reinado de D. Afonso Henriques, definição da fronteira e adopção da língua com D. Dinis, afirmação da causa da autonomia dos “portugueses” com o Mestre de Aviz, contacto com novas terras e novas gentes na Expansão, decadência do século XVI (e as suas causas peninsulares), sebastianismo, dominação filipina, Restauração e guerra, pombalismo como nosso “Iluminismo”, invasões francesas, guerras civis, melhoramentos materiais, decadência decimonónica e difusão do sentimento nacional a partir de 1890, até à República, ao Estado Novo, à Democracia e à Europa - descobrimos que a formação da “nossa identidade nacional” corresponde à constituição gradual de uma realidade complexa e não homogénea. Os nossos primeiros reis eram-no “dos portugueses”, mas D. Afonso II passou a referir-se a “Portugal”, como um organismo com a sua própria