O leite na história humana
Nilson Muniz*
Durante o transcorrer de um único dia são consumidos cerca de 2 bilhões de litros de leite em todo mundo. Um gesto tão corriqueiro, tão mecânico, que as pessoas mal se dão conta do valor dessa fonte de proteínas, cálcio e energia tão acessível, tão amiga. No entanto, esse ato tão prosaico só se tornou possível com o avanço tecnológico dos tratamentos térmicos e meios de conservação nos últimos poucos mais de cem anos. A ideia de utilizar o leite como alimento pelo homem primitivo deve ter surgido a partir de sua constatação de que podia se alimentar do mesmo leite que seus animais domesticados ofereciam às suas crias. Essa revelação ocorreu há 10.000 anos e teve grande impacto no desenvolvimento dos povos que conseguiram beneficiar-se do seu consumo via uma adaptação evolutiva de seu aparelho digestivo – a produção de uma enzima chamada lactase na fase adulta.
Assim, o leite merece ter sua trajetória vitoriosa explorada do ponto de vista histórico, tarefa sobre a qual poucos autores se dedicaram. Há muito o que se falar sobre seu importante papel na evolução da humanidade. Da sua fragilidade à sua permanência.
Este artigo pretende contar a história do leite e o desenvolvimento tecnológico que tornou possível sua produção e processamento em larga escala, utilizando como fontes a experiência de diversos autores, contida em importantes obras sobre o tema, como, por exemplo a Encyclopedia of Dairy Sciences, o mais recente livro da FAO – Leite e produtos lácteos na nutrição humana, do qual o autor deste artigo foi um dos revisores, bem como artigos diversos, revistas especializadas e outras publicações pertinentes. Também contribuirá para o conteúdo deste artigo, a própria experiência do autor de 39 anos de trabalho no setor lácteo no Brasil e na Europa.