O colera em maranguape
“uma doença não existe como um fenômeno social até que se convencione que ela existe – até que seja nomeada”.
A partir da afirmação do pesquisador norte americano Charles Rosenberg exposta acima, apresentamos uma proposta de percepção da doença que não apenas busque decifrar qual o agente etiológico de dada moléstia e compor um quadro numérico com dados de acometidos e vítimas fatais, muito menos uma simples listagem de receitas e fármacos que a combatam. A leitura que propomos é, sim, um olhar para a construção social da doença, pois como disseram Sournia e Rouffie “aquilo que chamamos de doença apenas tem existência em relação ao paciente e à sua cultura” .
A doença é mal que por princípio pode atingir a todos, sem se ater a fronteiras geográficas e sociais, e, diante da qual, em muitas vezes, o ser humano se vê sem nenhuma proteção. Contudo, a doença não existe como uma figura em latência na natureza, cuja existência é correlata a sua relação com o universo humano.
A cultura circundante ao indivíduo acometido por um agente epidêmico, seja bactéria ou vírus, tende a criar explicações próprias para o conjunto de sintomas que caracterizam tal doença, e é a partir da interpretação da relação entre homens sadios, agentes de saúde, religiosos, administradores públicos e dos próprios doentes com o conjunto sintomático que podemos ver a construção cultural de determinada doença.
Como disse Le Goff “a doença pertence a história, em primeiro lugar, porque não é mais do que uma ideia, um certo abstrato numa complexa realidade empírica, e porque as doenças são mortais.”
O cólera-morbus possui uma trajetória que o coloca como um dos grandes flagelos do século XIX, desde a Índia, mais especificamente da região do baixo Bengala, onde constituía seu “nicho ecológico” e possuía caráter endêmico, “(...) os especialistas consideram o termo endemia apropriado para doenças que provocam, em média,