o besteirol desnecessário
O HOMEM COMO XAMÃ DE SEUS SIGNIFICADOS [1]
A invenção da Cultura de Roy Wagner e o campo aberto para a reinvenção da antropologia
Valéria Macedo
PPGAS/USP
Experenciar o mundo é inventá-lo. Tal a idéia de Roy Wagner ao definir a agência humana como uma máquina de símbolos que opera por meio de uma dialética sem síntese entre convenção e invenção. Por sua vez, Cultura corresponderia ao modo predominante entre populações no Ocidente moderno de objetificação dessa experiência sob a forma de um domínio circunscrito de regras, valores e representações artificialmente estabelecidas, contrastado com um fundo universal de realidade, que abarcaria tudo que supostamente preexiste ao domínio cultural. As implicações antropológicas, sociológicas, psicológicas e políticas disso que o autor identifica como nossa grande ilusão são exploradas na obra A invenção da Cultura (The invention of Culture), só agora traduzida para a língua portuguesa por Marcela Coelho de Souza a partir da edição revista pelo autor de 1981, a ser publicada pela Cosac & Naify.
A 1a edição da obra, datada de 1975, corresponde ao período inaugural do que Eduardo Viveiros de Castro e Marcio Goldman vêm chamando de "antropologia pós-social" [2], em que pessoas com diferentes repertórios e trajetórias passam a ser afetados pelas mesmas questões, concernentes a uma recusa do pensamento entitário e dicotômico, que opera por meio de categorias como "indivíduo e sociedade", "natureza e cultura", "realidade e representação". De encontro a essas dicotomias e atravessado pelo pensamento melanésio, Roy Wagner, em artigo de 1974 ("Are there social groups in the New Guinea Highlands?"), introduz a noção de socialidade, em que o plano relacional ganha proeminência. Largamente incorporada e desenvolvida por sua interlocutora e também melanesista Marilyn Strathern,